O presente blog se propõe a reflexão sobre os Direitos Humanos nas suas mais diversas manifestações e algumas amenidades.


terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Maite Scheneider e o direito a uma identidade

E
Esta é Maite Schneider Caldas de Miranda (foto ao lado)
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Uma mulher com M maiúsculo, guerreira e vitoriosa, como tantas outras mulheres, não fosse um diferente fato: só obteve direito a um nome e identidade aos 37 anos de idade.
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Ainda que conheça sua história e já soubesse, através de uma lista de discussão sobre sua recente vitória, que adiante mencionarei, não achei ético divulgar aqui algo que havia sido informado num grupo fechado. Entretanto, ao final do capítulo de sábado da novela Viver a Vida, da Rede Globo, como ocorre todos os dias, surgiu um novo depoimento e ele era da Maite Scheneider.
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Fiquei bastante emocionado, pois desconhecia os detalhes da sua vida que ali foram expostos, em rede nacional, sem pudor, medo ou vergonha.
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O vídeo é rápido, objetivo e competente, bem no tipo de padrão "Globo" de ser:
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Maite viveu um processo transexualizador, durante sua infância, adolescência e parte da vida adulta. Nunca conseguiu um emprego com carteira de trabalho assinada e apresentar os documentos oficiais sempre causaram constrangimentos em sua vida, pois mostravam e identificavam uma pessoa que não era ela, assim ela mesma declarou.
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Não consigo imaginar, ser uma mulher, sentir como uma mulher e ter os documentos com o nome de Alexandre. Já se pira por este motivo, mas se agrava bastante quando além disto também tem que se enfrentar o 'lado de fora', ou seja, o olhar do outro frente a este fato. Se havia dor para ela esse confronto pessoal, imagino a lente de aumento sobre essa dor ao observar o olhar curioso do outro, muitas vezes cruel.
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Ora, depois da cirurgia adequando seu corpo a sua identidade de gênero, me parece óbvio que ela tentasse jogar no lixo todas as correlações daquela discrepância vivida, buscando um pouco da paz, que não teve. No entanto, a realidade é dura e muitas vezes perversa. Neste caso, a realidade da lei e burrocracia. Mesmo após a cirurgia, sua identificação se manteve destoante, impedindo a paz no confronto social, quando exigida. E é, por isto mesmo, ao constatar que após, de forma inédita, Maite consegue superar também este obstáculo, obtendo documento de identidade que corresponde ao seu corpo e suas emoções, que me pergunto como ela não correu para um cantinho, distante, em que ninguém lhe olhasse com qualquer tipo de olhar discriminador? Por qual motivo ela resolveu fazer caminho oposto?
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Ainda que Maite seja uma pessoa conhecida dentro do Movimento LGBT, poderia tranquilamente se reservar ao direito da privacidade, sem revelar detalhes da sua intimadade a estranhos, partilhando tais particularidades somente aos seus amigos pessoais e colegas militantes. Enfim, seguir sua vida em PAZ, algo que parece ser tão preciosa em situações tais. E poderia fazer orgulhosa consigo mesma, sem nada dever a ninguém! Mas não, num rasgo de generosidade, não surpreendente, Maite disse a que veio, foi a público e deu seu recado, justificando como se auto descreve em seu site:
"Sou Maite Schneider, atriz profissional, poetisa, escritora, depiladora, trabalho com TV e rádio, webdesign e lutadora por um mundo em que as pessoas possam ser elas mesmas, sem medo de arrancarem seus direitos e até perderem sua vida."
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Maite optou por LUTAR PUBLICAMENTE por DIREITOS HUMANOS, lembrando o significado, até então, de sua luta, o que faço reverberar:

O nome é a representação da pessoa humana.
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À vida segue-se o nome, identificador da pessoa, bem imediato que se lhe entrega. É o sinal caracterizador e indispensável a toda pessoa, determinante de sua personalidade pessoal e civil.
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É parte integrante da personalidade por ser o sinal exterior pelo qual se designa, se individualiza e se reconhece a pessoa no seio familiar e da sociedade. E, por isto, não é possível que uma pessoa exista sem esta designação pessoal. Deste modo, revela-se um dos requisitos básicos de nossa existência social.

Valendo-me das palavras de Edna Hogemann, "revela-se assim urgente e necessário a superação dos obstáculos consubstanciados pelo burocratismo e a falta de vontade política que impedem a eficácia plena da lei 6015, Lei dos Registros Públicos, tarefa sine qua non para a concretização do princípio da igualdade e o resgate da dignidade humana no Estado Democrático de Direito."

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