Não pude comparecer ao Seminário Estatisticas e Indicadores Sociais promovido pela UFRJ no meado deste mês, no qual estava inserido entre os temas a "Diversidade Sexual", a ser abordado pela Dra. Silvia Magaravite (foto ao lado), psicanalista. Por sorte, a mencionada palestrante publicou em seu blog "psicanálise para quê?" o trabalho apresentado.
Muito interessante e esclarecedor. Sugiro a leitura na íntegra.
A Dra. Magaravite esclarece psicaniliticamente a importância desta pesquisa do IBGE acerca dos números de casais homossexuais em nossa nação, valendo-se das lições de Lacan, que defendia que "aquilo que está no real precisa ser simbolizado, pois o que existe no real, caso não seja simbolizado, retorna para o mundo de modo fantasmático", aduzindo que a existência de casais gays é real, e a apuração realizada pelo Censo representaria sua simbologia, dando visibilidade.
O antropólogo e decano do Movimento LGBT, Dr. Luiz Mott, defende a mesma visibilidade, seja através das Paradas Gays e outras ações, nem sempre muito bem-visto, como a retirada do armário a orientação sexual de artistas, políticos, e demais pessoas públicas e famosas.
Dra. Silvia Magaravite contesta as terminologias diferenciadas, pois independente de sermos homossexuais, somos seres humanos. Enfim, critica os vários termos que são aplicados aos seres humanos, apesar da Constituição Federal reconhecer, em tese, uma igualdade de todos os cidadãos.
Para falar sobre a "resistência" da humanidade em aceitar a "homossexualidade recalcada", discorre sobre Freud:
"Freud, o pai da psicanálise, possuía uma compreensão acerca da sexualidade humana como “perversa polimorfa”, ou seja, como, ao nascermos, não temos inscrito no nosso inconsciente qual é o nosso próprio sexo anatômico e muito menos qual é nosso objeto do desejo sexual, a princípio, “todos seres humanos são capazes de fazer a escolha de um objeto homossexual e que de fato, esta escolha foi consumada no inconsciente.” Ele dirá também, referindo-se a estrutura psíquica "normal", que originariamente somos todos bissexuais. Essa organização psíquica se constitui na primeira infância, ou seja, entre 0 e 3 anos de idade."
E demonstra, por dados históricos, o tempo que se fez necessário para que a homossexualidade fosse retirada da lista de doenças:
Em 1930, Freud assinou a primeira petição discriminalizando a homossexualidade e em 1935, dirigindo a mãe de um homossexual
...
Mas foi somente em 1973 que a American Psychatric Association (associação psiquiátrica americana), deixou de considerar a homossexualidade como doença e isso se deu somente porque ativistas gays em 1970 e 1971 invadiram o encontro anual da APA.
...
só em 1993, que a OMS – A Organização Mundial de Saúde – retirou a homossexualidade da lista de doenças."
Diante deste período, a psicanilista volta ao tema e pergunta a razão de tanta resistência a homossexualidade recalcada. Ainda bem, pois só assim entenderemos qual o significado da "perversa polimorfa” em nossas vidas e o que é exatamente a tal "homossexualidade recalcada":
"Vamos olhar para essas datas, porque que a humanidade tem tanta resistência a uma coisa tão normal quanto a homossexualidade?Essas datas só nos mostram a enorme resistência da humanidade em aceitar sua homossexualidade recalcada. Pois de acordo com a própria questão da “perversão polimorfa”, em nossa infância, necessariamente teremos de fazer uma escolha do objeto sexual e deixaremos as demais possibilidades recalcadas. E para a maior parte dos sujeitos o que fica recalcado ou é a homossexualidade ou a heterossexualidade."
Identifico a "homofobia recalcada" sendo o alvo daquela suspeita levantada por muitos dos homossexuais em relação as atitudes discriminadoras dos homofóbicos, fazendo com que a maioria se questione sobre a possível existência da "homofobia internalizada". Isto porque, segundo o que entendi da psicanalista, TODOS os seres humanos tiveram que fazer uma escolha de um objeto sexual naquela fase da infância e deixaram "as demais" possibilidades (para os homossexuais, no caso, a heterossexualidade) "recalcada". Donde se conclui que em todo heterossexual, por sua vez, também resida uma "homossexualidade recalcada", sendo que alguns lidam bem com isto e outros não.
Neste sentido, conclui a Dra. Silvia Magaravite:
"E aquilo que vemos no social é que quanto maior for nossa dificuldade em aceitar em nós a homossexualidade recalcada, maior a possibilidade que temos de fazer deste outro, que pensamos ser tão diferentes de nós, objetos de nosso ódio, daí é que vemos tantas agressões e até assassinatos".
Me parece que a chamada "homofobia internalizada" decorre da "homossexualidade recalcada", apenas não sei se ambas são coisas distintas ou terminologias de um mesmo conceito.
De qualquer forma, muito rico o tema levantado no Seminário em questão. Ajuda a compreendermos melhor as dificuldades pelas quais passamos, sem as quais o enfrentamento só é dificultado. No entanto, apesar de algumas transcrições, imprescindível a leitura do texto integral, no contexto imposto pela psicanalista, pois à luz do óbvio, aqui houve uma pretensa retratação daquilo que me foi inspirado, o que necessariamente não representa a realidade do que foi exposto pela expert.
Nenhum comentário:
Postar um comentário